"Ser escritor é conhecer a dor e a delícia de possuir o eterno compromisso com uma folha em branco". Não me recordo quem disse essa frase, mas é verdadeira. Ser escritor é exatamente isso, conhecer tanto a dor — quando a inspiração se esconde lá no fundo de você —, quanto a delícia, aquela sensação boa de ver a folha, antes em branco, repleta de palavras.
Há uma coisa que me incomoda profundamente dessa tal de inspiração. Personificada, imagino que seria como uma criança bem mimada, querendo as coisas nas horas mais inoportunas. Só me brinda com sua presença quando não posso lhe atender, puxar um papel e, com a caneta na mão, deixar a mente vagar. Por que raios nunca tem um papel perto de mim nessas horas? E minha criança chora, grita, pede por atenção, até que se cansa e adormece, lá no fundo. E quem disse que acorda quando eu chamo?
Chego em casa, sento-me e, frustrada, encaro a folha em branco. Decido (tentar) dormir. Horas sem pensar em nada coerente. Enfim, quando o sono bate, Inspiração acorda. Começo a imaginar:
É um pátio muito bonito, cercado por colunas. O piso e as paredes são brancos e há alguns bancos escuros espalhados. Minha personagem favorita está sentada em um deles, com vários livros no colo e rodeada de amigas. Sente-se bem ali, sorri abertamente. Que lugar é aquele? Inspiração responde que é uma escola, e dá nome a todas as pessoas que rodeiam minha personagem.
Eis que o sorriso dela some, para depois se abrir de novo, tímido. Seu olhar acompanha um novato que anda sozinho pelo pátio, o cabelo raspado, a mochilas nas costas. Corresponde o sorriso dela do mesmo jeito. Aproxima-se, hesitante. As amigas já perceberam e se perguntam quem é ele, que chega cada vez mais perto. Meu Deus, eu preciso levantar e escrever isso.
Vou até o escritório vendo-os em minha mente. Ele se senta ao lado dela e a abraça. Puxa seu rosto com delicadeza e... Inspiração, acorde já, sua birrenta, eu acabei de me sentar!